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18 de Abril de 2024
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    Sextou e eu perdi minha comanda! E agora? Vou ter que pagar multa? Verdade ou mito?

    Muitas vezes ao irmos às casas noturnas, danceterias, bares, restaurantes, lanchonetes e etc. nos é fornecido uma comanda para o controle dos pedidos que geralmente fazemos ao estabelecimento comercial. Nesse momento, revela-se a responsabilidade de controle da comanda também ao consumidor. Mas isso é justo? É permitido?

    Publicado por Victor Mees
    há 6 anos

    Como diz o consenso de dois grandes amigos meus, e com toda razão, muito embora sexta-feira não conjugue verbo, temos que admitir que não haja momento mais oportuno para exercermos o nosso direito constitucional ao lazer, nas formas do art. 6 da nossa polêmica e sempre comentada Constituição Federal. E como hoje é sexta-feira, lembrei de um assunto que tem tudo a ver com as noites desse dia da semana tão especial.

    Muitas vezes ao irmos às casas noturnas, danceterias, bares, restaurantes, lanchonetes, até mesmo hotéis, motéis e etc. nos é fornecido uma comanda para o controle dos pedidos que geralmente fazemos ao estabelecimento comercial. Nesse momento, revela-se a responsabilidade de controle da comanda também ao consumidor. Mas isso é justo? É permitido?

    Este é o primeiro ponto que devemos analisar. Temos que concordar que o estabelecimento comercial é quem fornece o produto ou serviço ao consumidor, é ele quem possui toda mão de obra, toda a matéria prima e mercadoria para saciar os anseios de quem utiliza esse determinado produto ou serviço, em contra partida de uma contraprestação, isto é, o pagamento.

    Sendo assim, seguindo essa linha de raciocínio, não é justo que o estabelecimento comercial cobre dos consumidores essa responsabilidade de controlar seu próprio estoque, uma vez que se assim fosse, não haveria a relação de consumo, já que o consumidor estaria cumprindo um papel que é do fornecedor do produto ou serviço. Sob essa luz, o CDC (Código de Defesa do Consumidor) diz em seu art. 6, inciso III, que é direito do consumidor e não do fornecedor “a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço...”.

    E assim é interpretado pela lei, pela doutrina e pela jurisprudência, ficando entendido que este tipo de prática fere gravemente os princípios mais básicos do direito do consumidor, muitas das vezes de forma truculenta e constrangedora, através de ameaças, constrangimento ilegal e até cárcere privado.

    Hoje em dia é comum alguns estabelecimentos prescreverem em suas próprias comandas, avisos estipulando multa para aqueles consumidores que perdem sua comanda, ou seja, que falham em sua colaboração de controlar os seus respectivos pedidos. Percebam o quão injusto e abusivo essa prática é, não só viola o direito do consumidor, mas, sobretudo, todo o sistema de política nacional de relação de consumo. Dito isso, a lei proíbe em qualquer hipótese a cobrança de multa em casos de perda da comanda de consumação, afinal de contas, como foi dito, a responsabilidade do controle é do estabelecimento comercial.

    Sabe-se que essas multas geralmente são estabelecidas entre cem e quinhentos reais, mas existem casos que o valor extrapola a casa dos cinco dígitos. O CDC (Código de Defesa do Consumidor) considera essa cobrança abusiva, mais especificamente em seu art. 39, inciso V, e também, não menos importante, o texto do art. 51, inciso IV, do mesmo livro, reprovando o enriquecimento ilícito através de cobranças excessivas sob o consumidor, bem como considerando nulo todo tipo de cláusula contratual que seja abusiva.

    “Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

    V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva”.

    “Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

    IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade”.

    É importante lembrar que o consumidor na relação de consumo tem menos poder de barganha, de tal modo que a vulnerabilidade deste é reconhecida até mesmo por ventura da dignidade da pessoa humana, o que inverte o ônus da prova para o comerciante.

    Frise-se que os comerciantes que infringem todo esse sistema normativo estão sujeitos não só as penalidades do código consumerista, mas também as penalidades do Código Penal, que a depender do caso específico, podem ser altas, podendo sofrer ações cíveis e criminais, conjuntamente e independentemente. É o que diz o CDC:

    “art. 61. Constituem crimes contra as relações de consumo previstas neste código, sem prejuízo do disposto no Código Penal e leis especiais, as condutas tipificadas nos artigos seguintes.

    Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho, descanso ou lazer:

    Pena Detenção de três meses a um ano e multa.”.

    “Art. 75. Quem, de qualquer forma, concorrer para os crimes referidos neste código, incide as penas a esses cominadas na medida de sua culpabilidade, bem como o diretor, administrador ou gerente da pessoa jurídica que promover, permitir ou por qualquer modo aprovar o fornecimento, oferta, exposição à venda ou manutenção em depósito de produtos ou a oferta e prestação de serviços nas condições por ele proibidas.”

    Perceba o quão esse assunto é levado a sério pela lei consumerista. Quando o consumidor perde a comanda e por ventura ocorre coação moral ou física, existe uma exposição da pessoa e por óbvio um sentimento de constrangimento, que em consequência disso, o diretor, administrador ou gerente da pessoa jurídica que promove ou permite esse tipo de conduta, poderá sofrer consequências na formalidade da lei.

    Não menos importante, é de grande valia mencionar o que o Código Penal disserta sobre esse tema, em seus artigos 146, 148 e 158, onde o primeiro trata do constrangimento ilegal, o segundo elucida a tipificação do cárcere privado e o ultimo traz os casos em que há a prática de extorsão.

    Quando um funcionário ou até mesmo o próprio responsável pelo estabelecimento sustentam-se pelo excesso, exigindo que o cliente pague uma multa que não é permitida em lei, neste momento está configurado a prática do crime de constrangimento ilegal, que possui pena de 3 meses a 1 ano de detenção, ainda podendo o agente estar sujeito ao aumento desta pena, se houver, por exemplo, emprego de arma ou violência.

    Ainda cumpre lembrar os casos em que o cliente é privado do seu direito de ir e vir, sendo “preso” no estabelecimento até que se pague a multa para a liberação. Nesses casos, além do cliente sofrer a privação da sua liberdade, é exigida uma vantagem econômica indevida através do constrangimento ilegal, podendo o responsável pelo ato, ser punido pela prática criminosa disposta no art. 158 do Código Penal, que trata da extorsão, cuja pena de reclusão pode chegar a doze anos, além de multa.

    Por fim, quando o agente tão somente detém o consumidor no estabelecimento, configura-se então o cárcere privado, previsto no art. 148 com pena de até três anos, podendo ser aumentada em até cinco anos, ao exemplo de quando praticado contra menores de 18 anos.

    Dito isso senhoras e senhores, é mito dizer que “perdi a comanda, vou ter que pagar multa”. Claro e evidente, quando houver excesso ou afronta a dignidade do cliente, é sugerido que se faça um boletim de ocorrência, além da juntada de provas testemunhais, de vídeos, áudios e tudo aquilo que lhe for favorável, sobretudo, consulte um advogado para tomar as devidas providências.

    O conselho que se deixa para os estabelecimentos comerciais, é que este, faça-se valer de outros meios de gestão, possuindo em paralelo, outra forma de controle que venha subsidiar a tradicional comanda, como por exemplo, a venda de fichas ou a utilização de tecnologias como o leitor de cartão magnético, dentre outras formas. No mais, caso algum cliente venha perder a comanda, o mais adequado é tratar a situação com calma e paciência, prezando sempre pelo acordo. Não é apropriado utilizar-se do constrangimento ou ameaças, afinal de contas ameaçar também é uma pratica delituosa. Nunca, em nenhuma hipótese deve ser cobrado multa, uma vez que é ilegal, no contrário, o consumidor terá direito ao ressarcimento em dobro pela cobrança indevida, além da pessoa jurídica e seus representantes poderem sofrer as penalidades cíveis e criminais.

    Para concluir, investir em tecnologia e outras formas de controle é o melhor a se fazer, visto que evita situações constrangedoras para a empresa e para os clientes, preserva a imagem do estabelecimento, impede ações judiciais e logicamente é um investimento muito menos custoso. Além do mais, vamos combinar que o estabelecimento que não consegue controlar e organizar suas próprias cobranças, não é passível de possuir qualquer tipo de credibilidade.

    Por Victor Mees.

    Boa Sexta a todos! Se beber não dirija!

    #mechama

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